quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Verão... calor... sol... e trabalho... Parece que essas coisas não combinam, correto?
Você vai pegar o ônibus e ele demora o dobro do tempo pra passar, pois está em "horário de verão", mas seu trabalho continua no mesmo horário velho e ranzinza de inverno...
O centro da cidade continua cheio de gente, mostrando que esse horário de verão não existe pra muitas pessoas, que continuam enfrentando o mesmo pique diário de sempre só que um calor muito maior e uma disposição ao trabalho inversamente proporcional a ele.
Quando trabalho no verão, sempre lembro de um poema do Jacques Prévert, que vi nas minhas longínquas aulas de francês, que reproduzo aqui numa tradução em português:
"Diante de porta da fábrica
O trabalhador súbito pára
O dia lindo o puxa pela roupa
E como ele se volta
E olha o sol
Tão rubro tão redondo
Sorrindo no seu céu de chumbo
Dá uma piscada
Familiar
Diz então camarada Sol
Não achas que é
Uma grande idiotice
Dar um dia como este
A um patrão?"
Gosto muito dessa imagem do tempo bom puxando o cara pra fora do trabalho e o levando para outro lugar... e realmente é isso que a gente sente: como se o sol, o calor, a brisa... tudo nos convidasse a sair, a passear, a sentar preguiçosamente em um parque, a tomar um banho de piscina, ou de praia; e, no entanto, fôssemos obrigados a ficar fechados em um local realizando uma atividade enfadonha.
Engraçado que, no inverno, o enfadonho parace menos enfadonho que no verão... a prisão diária eufemizada na palavra "trabalho" parece, num dia frio e de chuva, mai suportável.
No calor e no dia bom, no entanto, parece que estão nos roubando o mundo, que estamos fechados em uma sala alheios a tudo, deixando o mundo passar lá fora. E, infelizmente, o mundo passa lá dentro também, mas, anestesiados, não sentimos.
"É uma grande idiotice dar um dia como este a um patrão", é verdade... Várias vezes me vejo compelido a me deixar levar pelo tempo bom, a ser carregado por ele para onde ele quiser me levar... mas é impossível: as contas apinhadas na caixa de correspondência, a necessidade de fazer supermercado, a necessidade de conforto meazem doar meu dia lindo a uma sala fechada. Eu chamo de "choque de realidade" apesar de a realidade propriamente dita, neste caso, ser a utopia que deixamos lá fora.