segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Ajudáveis



Outro dia, eu havia saído do trabalho, pegado um ônibus até o centro e, do centro para minha casa, eu tenho optado por vir a pé. Não é um trajeto tão pequeno, é uma boa caminhada, mas, dadas as condições do transporte público, acaba me sendo mais fácil do que me atopetar em um ônibus lotado e demorado, em condições desumanas de receber pessoas ou esperar horas em uma fila por um lugar em uma lotação.
            Nessa caminhada diária, resolvi passar no supermercado comprar suco de laranja, que estava faltando. Eu sou assim mesmo: entro no supermercado para comprar uma ou duas coisas, não pego carrinho nem cestinho de compras e, depois, vou encontrando pelo estabelecimento outras tantas coisas de que também preciso e, quando vejo, estou com as mãos e braços cheios de compras que nem consigo carregar direito.
            Dirigia-me então ao caixa atrolhado de produtos nos braços, mãos, equilibrando-os com o peito e até o queixo. Entrei na fila para esperar minha vez de ser atendido e despejar aquelas quantidades na esteira rolante do caixa.
            Foi quando um rapaz  da fila ao lado abaixou-se, pegou um cestinho que estava no chão perto de si e me alcançou. Agradeci meio incrédulo com um “obrigado” baixinho e pus minhas aquisições no objeto. Ele sorriu e disse “Estava ali dando sopa...” referindo-se ao cesto de compras. Eu não falei mais nada. Poderia ter agradecido com bem mais veemência, poderia ter dito alguma coisa... mas não consegui.
            Saindo do supermercado, isso me fez pensar em duas coisas:
            Primeiro: a gente está tão desacostumado a receber um ato de generosidade de outra pessoa, que não sabe nem  como agradecer quando isso acontece. Na nossa vida atual, com tanta gente nos esbarrando na rua e não pedindo desculpas; nos xingando por coisas que elas próprias fizeram, com vontade de descontar toda a frustração de suas vidas no primeiro que passar pela frente;  tão ensimesmadas que você muitas vezes está preparado para se defender e um ato mais altruísta de surpreende.
            O rapaz fez o que sua boa educação o mandava: ajudar uma pessoa mais velha em dificuldade. Ou ajudar qualquer pessoa em dificuldade, em suma. Um ato que não lhe custou nada, tenho certeza, mas que é muito difícil hoje em dia. Um ato físico simples eu diria, mas um ato mental maior: o de pensar no outro, no que o outro pode estar precisando; o de se colocar no lugar de alguém e imaginar suas dificuldades, que, talvez hoje não seja assim tão simples.
            O que leva a um segundo fato: o rapaz, ao ter o desprendimento de pensar no outro, poderia ter seu ato altruísta visto com maus olhos à pessoa que ele tentou ajudar. A pessoa poderia ter-lhe dito “Eu te pedi ajuda?” “Você acha que eu não sei me virar sozinho?” ou algo do tipo. Há pessoas incapazes de reconhecer no outro um ato positivo. Iriam tentar achar um motivo excuso na boa intenção do outro. São pessoas que não se abrem para serem ajudadas. São “inajudáveis”, digamos. Eu não faria isso, obviamente. Entendo um gesto de desprendimento e o valorizo. Mas creio que para que um ato de generosidade possa ter êxito é preciso uma parte querendo ajudar e outra disposta a ser ajudada. E, se você quiser ajudar aos outros, tem que estar preparado para que sua ajuda, às vezes, não seja muito bem recebida.