sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Possibilidades

Sabe quando vocês pegam um pedaço de conversa de alguém quando passa na rua? Ou observam a fisionomia de uma pessoa passando por vocês? Não sei vocês, mas eu, muitas vezes, começo a criar uma história para aquela pessoa, imaginar o contexto em que aquela frase ou expressão se encaixa. Duas pessoas passam e vocês ouvem uma delas dizer um “Que sacanagem você fez com ela! Coitada!” Vocês ficam tentando imaginar quem é a pessoa que foi sacaneada? O “sacaneador”, por que fez tal ato? O que uma pessoa com aquela cara, aquele tipo físico, poderia ter feito? E o outro, o que acusa o amigo de sacana, que parte tem a ver com a história? Não sei vocês, mas eu às vezes me pego pensando nisso tudo.

Por exemplo: Há um tempo atrás estávamos minha namorada e eu na Redenção sentados num banco num sábado, pegando um pouco de sol. Trabalha-se o dia inteiro em um lugar fechado, no fim de semana, é preciso um pouco de sol, um pouco de verde. Estávamos lá quando observamos uma moça que se passeava impaciente de um lado para outro, como que esperando alguém. Estava bem arrumada para uma caminhada no parque. Supusemos nós dois que se tratava de um primeiro encontro. Certos momentos depois, aproximou-se um homem de roupa bem frugal: camiseta, tênis, jeans, destoando um tanto da produção dela. Cumprimentaram-se meio formalmente e seguiram caminhando pelo parque, um a uma certa distância do outro. Pela impaciência da moça na espera, pela formalidade de cumprimentos... o mais provável era um encontro de Internet. Os dois devem ter trocado e-mails, mensagens de MSN, provavelmente telefonemas (ou qualquer outros meios de hoje em dia – estou fora de área de cobertura em se tratando de namoros de Internet) por semanas até marcarem o fatídico primeiro encontro... num local público, cheio de gente, claro! Vai que um dos dois é um tarado.

Quem já tentou alguma vez um namoro pela Internet sabe que você encontra alguém com uma boa conversa, um papo que flui pelo telefone durante semanas e, quando o encontro acontece ao vivo, o encanto pode morrer em cinco minutos. Talvez tenha sido isso o que aconteceu com esses dois personagens de minha história, visto que, em seguida disso, minha namorada e eu resolvemos voltar pra casa e eis que a moça passa por nós a passos rápidos, firmes, com jeito de furiosa. Um táxi passa, ela acena, tenta pegá-lo, mas ele não para. Ela continua a passos duros. O que terá acontecido? Teria o cara tentando avançar o sinal logo de cara e ela não gostou disso? Teria ele entregado assim de pronto que é casado? Teria mau hálito? O que poderia ter o homem feito para que ela saísse da Redenção tão rápido e naquele estado? Nunca irei saber, mas já criei várias hipóteses.

Essa história me veio à cabeça porque ontem eu estava voltando do trabalho, entrei numa lotação e, ao me sentar, vi que embaixo do assento havia uma caixa de remédio. A curiosidade matou um gato e um não gato como eu triplamente: abaixei-me e fui ver o que era. Li o rótulo: NEOVLAR. Não fazia ideia de que remédio era, mas notei que estava aberto, mas, pelo peso, ainda deveria conter um blíster com vários comprimidos dentro. Larguei a caixa e deixei pra lá. Ao chegar em casa, a curiosidade (essa que leva para o outro Mundo até aqueles que têm sete vidas e caem em pé, imagina os seres menos afortunados!) me fez entrar na Internet e pesquisar: sim, imagino que você já saiba, NEOVLAR é uma marca de anticoncepcional. O que me fez pensar: o que faria uma mulher (sim, tudo faz crer que tenha sido uma mulher) comprar uma caixa de anticoncepcional em uma farmácia, entrar em uma lotação, abri-la, (supostamente) tomar um comprimido e deixá-la ali jogada no chão da lotação? Teria feito ela algum ato cujas consequências poderiam lhe ser desastrosas num futuro próximo e resolveu tomar uma pílula na vã esperança de que resolvesse alguma coisa? Nesse caso, não seria melhor uma pílula do dia seguinte ou algo assim? Ou então, no mínimo, seguir regularmente o resto da cartela? Teria ela esquecido de tomar o dito comprimido naquele dia e comprou-o para não interromper o efeito e, na pressa, deixou-o cair no chão sem perceber? Teria ela, então, comprado um anticoncepcional que nunca antes tomara, por indicação de alguma amiga e, ao ler a bula, assustara-se com os efeitos colaterais e resolvera jogá-lo ali mesmo fora e aderir a outros métodos contraceptivos? Como diriam alguns textos chiques: “há uma miríade de possibilidades”. A mim, cabe apenas deixar minha imaginação navegar sobre elas...