“A vida é um cão sentado à beira do caminho.” Escrevi essa
frase uma vez quando eu era adolescente. Não passei à frase seguinte do suposto
poema. Era um verso ruim demais... Até para meus padrões poéticos. Gosto de
escrever contos, crônicas... mas poemas
são meu calcanhar de aquiles. Nunca
escrevi um que fosse sequer razoável.
A vida é um cachorro... Um cachorro sentado... Sentado à
beira do caminho...
O que eu poderia querer dizer com isso?
A vida não é pensável? Irracional? A vida é subserviente,
leal como um cão? Às vezes pode ser furiosa?
A vida não se movimenta? Está sentada? É perene? Imutável?
A vida não tem rumo? Está sentada à beira do caminho?
A vida da gente é à margem do mundo?Está à beira, não no
caminho em si? Nossa existência é tão desprezível, que é alheia ao curso em si
do Universo como um todo?
A vida é idiota? É um cão sentado à beira do caminho? Ou é
muito mais simples do que a imaginamos?
Para qualquer frase, por mais estúpida que seja, sempre há
uma interpretação. No caso desse verso, eu não sei se tinha uma quando escrevi.
Também não faço ideia do que eu escreveria depois. Não vejo uma sequência
plausível para uma atrocidade “literária” dessas.
Rasguei a folha na hora e desisti. Mas o verso ficou ecoando
na minha mente até hoje.
Escrevi, nesses anos todos, vários poemas. Rasguei
praticamente todos os que escrevi. Tenho até um neste blog e talvez esteja ali
porque esqueço que ele existe. Mas essa
frase, a mais estúpida de todas, está até hoje comigo. Foi rasgada fisicamente,
mas não desapareceu. Senti então que precisava escrevê-la de algum jeito. Se
não num poema, pelo menos numa crônica.
Talvez escrever poemas seja um cão sentado à beira do
caminho.
Talvez escrever em si seja um cão sentado à beira do
caminho.
Seja lá que interpretação se queira dar a isso.