Lembro que, quando criança, assistia a desenhos animados em que o herói ia para um terra paralela, onde existia uma versão malvada dele mesmo, que seria teoricamente seu oposto. Era um oposto em uma ou duas características apenas. Se o herói era bom, seu oposto era mau... e parava por aí. Não era fisicamente oposto, tampouco o era em habilidades...
Na época eu não entendia por que, além da distinção entre bem e mal, o sujeito não era diverso de sua cópia paralela em tudo: um herói destemido, superpoderoso, alto, atlético, inteligente... deveria reconstruir-se como um ser medroso, fraco, baixo, gordo, imbecil... Se era um homem, deveria, como contrário, ser uma mulher, de repente. Se era jovem, tornar-se-ia velho... E assim por diante.
Hoje compreendo que um ser diametralmente oposto a outro seria de tal forma diferente, que sequer seria reconhecido como oposto. Seria um ser tão irreconhecível ao outro que nenhuma característica sua guardaria.
Ai eu passei a me perguntar se esse ser extradimencional não habita na verdade algum lugarzinho dentro de nós e fica ali escondido pronto para sair. Gruda-se ao nosso ser mais profundo e funciona como aquele diabinho das histórias em quadrinhos que te manda seguir o caminho errado.
Algumas pessoas liberam esse serzinho vil e o deixam viver livremente em suas ações, em seus sonhos e desejos. O diabinho espertamente vai corroendo a pessoa, dilacerando-a por dentro de tal forma que, quando se vê, do ser original só restou a casca. E o monstrinho domina pra sempre feliz aquele corpo morto.
Outras sufocam, escondem, guardam trancada dentro de si a criaturinha. Esta fica ali, escondida, calada, mas pronta. Qualquer momento de fragilidade do hospedeiro, qualquer deslize, crau, sem perceber, ele está no domínio da situação.
Poucos são os que conseguem viver em paz com seu contrário, domá-lo, mantê-lo cativo, obediente, aplacado... ainda que por um preço. O risco é que, nessas pessoas, frente e verso às vezes tornam-se um só, sem mais separação, sem mais distanciamento entre um e outro.
Qual a alternativa, então? Deixá-lo solto? Coibi-lo? Escancará-lo? Aceitá-lo? Talvez não haja uma resposta. Talvez todos nós sejamos um dia consumidos por nosso avesso. Talvez ele funcione como aquelas plantas que se alimentam das outras, entranham-se nelas... depois as matam.
Ou talvez nós sejamos no fundo o monstrinho e nosso lado aparentemente bom seja apenas uma máscara sob a qual ele se esconda.
segunda-feira, 11 de abril de 2011
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